José Eduardo Agualusa virou um escritor em moda no Brasil. O visual de galã de novela e principalmente os romances leves e povoados de aventuras converteram esse angolano de 43 anos (e aparência de 25) em figura popular no meio cultural. O compositor Caetano Veloso foi um dos primeiros a chamar a atenção do público para as idéias de Agualusa sobre a questão negra e o papel que o Brasil ocupa em relação às antigas colônias portuguesas e à velha metrópole, Lisboa: o de síntese entre África e Europa. Em seus livros - cinco romances já foram lançados por aqui -, ele propõe uma conexão entre os três continentes que foge à atenção dos próprios brasileiros. Os personagens em constante movimento refletem a situação do autor, que mora entre Lisboa e Luanda, tem parentes em São Paulo e já viveu no Recife e no Rio de Janeiro, entre 1998 e 2000. Os deslocamentos lhe propiciaram desenvolver um estilo peculiar, que mistura brasileirismos e a gíria urbana de Luanda de forma enxuta e clara. Escritor profissional e colaborador de jornais em Lisboa e Luanda, Agualusa orgulha-se de se autodenominar afro-luso-brasileiro. Ele não apenas adora o Brasil, como tem no país uma das fontes mais poderosas de suas histórias. Retornou ao Brasil na semana passada, para lançar seu mais recente livro, O Vendedor de Passados (Gryphus, 200 páginas, R$ 32), sobre um especialista em reescrever a biografia dos fregueses na emergente sociedade urbana de Angola. Nesta entrevista a ÉPOCA, Agualusa afirma que o Brasil, apesar de cordial, ainda é um país colonizado e racista, critica a obra do português José Saramago, por considerá-la niilista, e revela o segredo de seu método de escrever.
ÉPOCA - No romance O Ano em Que Zumbi Tomou o Rio, você faz um retrato aterrador dos morros cariocas, dominados por traficantes de drogas e sob a liderança de um revolucionário angolano. Este personagem afirma que o Brasil ainda não se descolonizou, ao contrário de Angola. Você concorda com ele? Agualusa: É a minha opinião. O Brasil ainda é um país moldado na escravatura, igual à África. O Brasil tem uma África dentro de si e às vezes não lhe dá atenção. Aqui, como em Angola, por exemplo, existe a figura da babá negra que passa de geração em geração; há o moleque criado como se fosse filho, mas, na verdade, ele trabalha na casa, sem remuneração. Negro e pobre são condições que se confundem no Brasil. Não se criou aqui, como em Angola, uma elite negra. A gente repara nessa desigualdade no dia-a-dia, na relação entre as pessoas, e até mesmo na cultura. Atualmente não dá para citar um grande escritor negro ou mestiço brasileiro. Isso é incrível porque no século XIX havia grandes escritores afro-descendentes, como Machado de Assis e Cruz e Sousa. Pior ainda, não há um único grande autor indígena - algo que acontece em toda a América. Enquanto não enfrentar o problema e não der maior participação aos negros, o Brasil não terá se descolonizado. O Brasil é colônia. ÉPOCA - Você considera os brasileiros racistas? ÉPOCA - Por que você é tão fascinado pelo Brasil?
ÉPOCA - E o que é genuinamente brasileiro que não se encontra em outros lugares do mundo? ÉPOCA - Como você vê a situação política do Brasil hoje?
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José Eduardo Agualusa |
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