A fiscalização na era Santos "Kipexe"
Escrito por Arnaldo SantosA memória remota não procede para os mais novos, dito de outra maneira mais adequada ao estilo dos meus netos, "não tem nada a ver" com este nosso actual modo de viver.A lembrança de Santos "Kipexe" seria deslocada se ele não se mantivesse como um exemplo abnegado de servir a sua comunidade. Desde manhãzinha, a Luanda dos musseques, que começava a partir da lagoa do Kinaxixi, ouvia o roncar da sua mota com "saidecar", era assim que lhe reconhecíamos. Fiscalizava com seu grande cachimbo sempre fumegante e o cipaio como acompanhante, lixos e águas paradas. E as donas afadigavam-se. O cenho franzido de Santos "Kipexe", metia mais medo que as multas com que apenas ameaçava.
Enfim, não me estendo mais nessas recordações, não quero influenciar ninguém, mas é bom e simples de ver, que vigiar o cumprimento das leis, embora possa ser temido pelos relapsos, tem boa reputação entre os cidadãos. É uma prova directa de que os interesses e bem-estar da sociedade estão a ser observados pelos que governam.
A fiscalização com o andar dos tempos tornou-se em algo de ambíguo, como se tivesse constituído um poder à parte, ou paralelo. Tem casos que parecem não só não comungarem com os seus objectivos benignos, mas como que até se lhes opusessem. É pernicioso para aqueles que se apercebem que não estão a ser governados de acordo com o espírito das leis que só podem ser boas.
No entanto e por um incidente vulgar na minha rua sujeita à Administração da Maianga comprovei que os espíritos raramente estão presentes quando a fiscalização intervém. Era sábado e àquela hora só interessava a quantidade de pingos que poderiam ter sido vertidos na rua, pelos moradores que se atreviam a limpar os seus carros. A fiscalização entendia que era lavagem ao invés de limpeza, tudo era possível na discussão até a semiótica, mas eles eram muitos, traziam grampos para bloquear e carro de reboque com guincho. Foi então que veio à baila a memória de Santos "Kipexe".
São questões de lana caprina, desdenhar-se-á quem não tiver experimentado o poder da fiscalização que o povo passou a identificar de "pentear". Não foi o que aconteceu no caso relatado, mas dele pode extrair-se a conclusão da necessidade urgente de regulamentar as leis sobre as transgressões administrativas. Doutro modo essas práticas arbitrárias podem contribuir para a desmoralização da sociedade e transformar-se de facto num pente para facilitar o esbulho dos mais fracos.
Fonte JA
Luanda na sombra do Cadaval
Escrito por Artur QueirozO meu professor de Ciências Naturais, no Liceu Salvador Correia, um dia levou a turma ao Museu de Angola, ali mesmo no Kinaxixi, com vistas para a Floresta e pátria sonora de mestre Arnaldo Santos.