“O teu olhar triste e sereno em cada esquina
são lágrimas que fluem do teu rosto
por um coração cheio de dor
apagaram dos teus lábios a palavra amor
que por uma vez se agigantou
deixando marcas de temor
Quando cantos ao luar
Quantas promessas conjugais
quanta poesia sexual
quantos ciclos sentimentais
O tempo apagou as feridas
mas deixou o destino ás escuras
De quantas meninas partidas
diz – se negro olhar
Foram muitos os temporais
Porque passaram muitas mães
mas o mais negro temporal
veste – te de preto minha Mãe”.
In Vivências – Páginas - 12
Maria de Fátima (Chó do Guri) nasceu a 24 de Janeiro de 1959, na Quibala, Província do Kwanza – Sul. Aos dois anos veio para Luanda onde reside, com a mãe, no Bairro Operário. Devido as muitas adversidades que a vida apresenta, aos 4 anos é internada nas madres do São Domingos até ao infortúnio dia em que pereceram dezenas de crianças neste internato.
“Com a teimosia da noite medonha/O confronto das palavras sedutoras/Amamenta/ a solidão/Sob o piscar das estrelas /Ou no coscuvilhar da lua /Erguem - se castelos de poesia/ Dedos deslizam no teu corpo/Para o espírito consolar /E quando a noite/ sucumbir/ Gema carne devorada /Vomitadas dia branco Vivências”...
In Poemas Vivências Luanda - 1996”
A veia poética nasceu-lhe ainda muito jovem. A sua primeira poesia foi publicada em 1988 no jornal Mural da Associação de Estudantes Angolanos em Portugal.
Chó do Guri, já publicou três obras, nomeadamente: Vivências, um livro publicado em 1996. Dois anos depois, publicou a obra Bairro Operário – A minha História, uma obra que narra a sua infância. Em 2000, publicou o seu terceiro livro intitulado Morfeu.
“Apalpo os teus olhos/ Na noite/Mordo os meus lábios/Silenciados pelo teu gesto/vernacular/Que me anuncia a escuridão/Oh noite enlevada de breu/O lacónico piso da seda ocular/ Me entrega solene à Morfeu/ Ah! Como é bela a noite entre tu e eu/ Nos cílios do céu. In
Morfeu –Luanda – 2000.
Para o escritor Ricardo Manuel: “Chó do Guri nas suas vivências na vida não cala a mágoa de queixumes doloridos e, esbate em tons amargos as figuras empobrecidas dos meninos inquilinos da rua, das prostitutas (quantas vezes incompreendidas!), de almas que amam e são desamadas e dos homens desatentos aos conflitos que tanto apoquentam a humanidade”.
“Isto não é poema/ É o meu grito de angústia/Na boca do povo em algazarra/É lamento na rua/ “é lambula, lambula, lambulééé...”/ como um cântico à desgarrada/Isto não é poema/ É a dor do desconsolo/ Ao aperto da miséria/“menos preço, menos preço, menos/ preçoééé...”/como um cântico à desgarrada/Isto não é poema/É vida?/É morte?/ Então o que é/Se o meu poema ainda dorme/Com a boca de fome/Como soneto da casa sem pão/Que faz do filho um ladrão/“agarra o ladrão, agarra o ladrão, agarro ladrãoééé...”/ como um cântico à desgarrada/ Isto não é poema/ É lamento/É o cântico sofrido de um discurso sem fim/ “é lambula, é lambula, é lambulééé...!/menos preço, menos preço, menos preçoééé...!/agarra o ladrão, agarra o ladrão, agarra o ladrãoééé...!”
Para Jomo Fortunato, professor universitário e crítico literário: “ A escrita no feminino tem uma feição estética, peculiar porque aflora rumos de individualização temática e lexical, só possíveis no universo existencial da mulher. O Romeu nunca desempenha o papel de Julieta, e o universo também é válido. Cada desempenho no seu galho.com Chó do Guri ficamos impressão de estarmos perante o inédito, o sentido o humano e o solitário”.